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1984
M conta-me a sua aventura do alto dos seus quinze anos.
Saiu de casa de madrugada. Deixou um bilhete aos pais a dizer que já era adulto e que estes não se preocupassem. Apanhou boleia de um camionista na EN1 e foi até ao Porto. Apareceu de surpresa em casa dos tios para jantar e estes, estranhando verem-no tão longe de casa, telefonaram aos pais de M, mas este já se tinha posto a caminho do seu destino, Vila do Conde, onde haveria de dormir ao relento na praia.
Comprou, na manhã seguinte, um bilhete para as corridas do campeonato nacional de velocidade. M é um apaixonado pelas competições automóveis e já me levou algumas vezes a ver rallies a Sintra e corridas ao Autódromo do Estoril.
No fim das provas, ao final da tarde, aproximou-se dos pilotos e mecânicos que arrumavam o material e pediu boleia para Lisboa. Um deles, Mário Silva, disse-lhe que o levava e, nessa noite, após um dia de quase completo jejum, uma vez que o dinheiro que levara era à justa para o bilhete das corridas, acabou por jantar rosbife com os pilotos num restaurante de luxo.
M surgiu em casa de madrugada, a mãe chorando o alívio das mais de vinte e quatro horas de insana preocupação que não a deixaram dormir.
Enquanto me conta a sua aventura, o ar de M é de naturalidade, como se fosse habitual fazer coisas assim. Mas eu, que sou cinco anos mais novo, não acho nada normal o que ele fez. Pelo contrário, acho que é a história mais espantosa e corajosa que já alguma vez me contaram.
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